quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Vida Acadêmica, Sabedoria e Alterando a Realidade

Texto do Noir Moguchaya - Maringá-PR:

O que é a vida acadêmica?

Será que ela acontece fora da sala de aula ou se encerra dentro desse limite? A vida acadêmica, e o que fazemos dela, afeta intimamente tanto o nosso próprio crescimento quanto o da Universidade como um todo. No tempo que passamos na Universidade devemos valorizar o contato com pessoas com os mais diferentes interesses. Mas isso não acontece, sobretudo porque estereotipamos a diferença e, assim, subestimamos seu potencial.

Uma única pessoa é capaz de saber tudo o que é conhecido como faziam os Sábios do Passado?

Pensando melhor, o saber pode significar uma descrição de eventos (informações) com uma explicação dos mesmos. Entender as teorias que explicam de maneira mais abrangente o que a nossa percepção imediata nos apresenta nos faz obter uma nova percepção do mundo. Assim, nossa proposta não se restringe a fazer previsões e coletar dados e sim a uma compreensão da nossa relação com o mundo, um auto-conhecimento. Ascendendo gradativamente dos efeitos às causas, do particular ao geral, do simples ao composto: um único ser humano será capaz de saber a melhor forma de se relacionar com a vida.

Como alterar a nossa realidade?

A todo instante somos atravessados por forças externas advindas do campo etnico-político – podendo ser as condições do trabalho, os vínculos sociais, a filogênese familialista, o campo cultural evolucionista, a faseabilidade – chegando a nosso corpo e, por meio deste, à nossa subjetividade, consciente e inconsciente. E a nós cabe a escolha de ora cristalizar tais forças em valores, e assim somos repetitivos, ou, então, transvalorizá-las, e, pelo nosso desejo, direcionar a criação e potência.

"É essa a finalidade da esquizoanálise: analisar a natureza específica dos investimentos libidinais do econômico e do político; e, por aí, mostrar como o desejo pode ser levado a desejar sua própria repressão no sujeito que deseja."

– O Anti-Édipo: Capitalismo e Esquizofrenia, Deleuze & Guattari, págs. 137/8.

Comentário do Mário Lopez:

Acima, está um texto escrito pelo Noir Moguchaya com a finalidade de suscitar um grupo de estudos na sua faculdade em Maringá-PR.

A eloquência do seu estilo altamente intelectualizado demonstra claramente a intensidade da sua "vida acadêmica" atual, além de dar-nos motivos para orgulhar-nos do sucesso da nossa academia brasileira, claramente atingindo os objetivos de formar uma elite intelectual para competir no mercado globalizado
.

São dúvidas, como as dele, e as levando em discussão, que os nossos alunos de faculdade irão se preparar para agir na dinâmica dos grupos de especialistas, cada qual com os seus vocabulários de área. É importantíssimo que o aluno tenha contato com esses outros vocabulários.

Antigamente era obrigado estudar Marx no departamento de Filosofia-USP, hoje, não é mais, mas na época, o Marx também se estudava na Sociais e Economia. Mas o Marx da Economia, o Marx da Sociais e o Marx da Filosofia eram todos o mesmo pensador, só que estudados de abordagens radicalmente diferentes de uma à outra.

Então um aluno da Sociais que fala de Marx para um aluno da Filosofia é bem diferente do que falar de Marx para outro aluno da Sociais. Alunos de áreas diferentes vão sempre precisar "aprender" a linguagem da outra área, mesmo falando do mesmo pensador.

E é dessa instituição de troca de linguagens que a ditadura brasileira sempre se sentiu ameaçado, tentando, durante anos, controlá-la de forma opressiva.

Uma entrevista da rádio americano Science Friday com convidado Prof. Dr. Jonathan Kandell da Universidade de Maryland colocou em dúvida a ameaça dessa instituição acadêmica com o avanço de bate-papos, jogos online e internet do tal vício pela internet ou "Internet Addiction."

Em um momento, o próprio Kandell disse assim: "Eu não estou querendo incentivar o uso de maconha, mas pelo menos os alunos estão fumando em grupo! Algo que não acontece com os viciados na Internet!"

Uma outra tradição da academia brasileira para ressaltar pode ser exemplificado na tese de mestrado da Jacira de Freitas Rosa pela FFLCH-USP "Política e festa popular em Rousseau : a recusa da representação" de Dezembro de 1997.


Quando ameaçado a festa popular dos estudantes, também está ameaçado o espaço físico de diálogo universitário (como fazia com a política de opressão do movimento estudantil e o tema "não a bebidas" por exemplo).

Segundo Kandell, apenas 30% da aprendizagem ocorre dentro da sala de aula e no laboratório, os outros 70% ocorrem nos corredores, nas praças, no estacionamento, nos pontos de ónibus, nos ónibus que pegam vias universitárias, no bandejão, nas repúblicas, nos conjuntos residenciais e nas festas. Enfim, no espaço físico aonde possa ocorrer um diálogo interdisciplinar.

O projeto do Rentato Janine Ribeiro por exemplo "Projeto de curso experimental de graduação interdisciplinar em humanidades" foi acusado de "elitismo" e praticamente descartado.

Isso merece um desabafo de fatos sobre o movimento estudantil no campus da USP-SP:

O bandejão central da USP-SP passou anos sem café da manhã. O bandejão da Química-USP foi desativado para reformas durante anos. O bloco E do CRUSP foi desativado para reformas durante anos. A reitoria antiga passou anos vazio enquanto blocos K e L do CRUSP foram "ocupados" pela reitoria, bloco H foi demolido. A FFLCH e FEA estão fisicamente localizados em lugares diferentes hoje (já compartilharam o mesmo pátio). As entradas da Quimica-USP do lado da escada da FFLCH andaram fechadas quantos anos? O DCE-USP andou sob reforme durante um tempo absurdo.
A tentativa de levantar um grupo de estudos com RPG e Educaçaõ no CRUSP "Teatro da Imaginação" foi enterrado no departamento de Cultura e Extensão da Reitoria-USP em 2003. E não há uma única rua na USP-SP que não passa um tanque de guerra!

Coincidências? Ou repressão do movimento estudantil? Sempre que aparecer um indivíduo como Noir Moguchaya, com vontade, coragem e a garra de correr atrás das nossas tradições de criar um diálogo maior, esse indivíduo merece aplausos! Porque ele luta pelos ideais da nossa bandeira nacional! Ordem e Progresso! Parabéns Noir Moguchaya!

E encerra-se essa entrada com a carinhosa canção de Geraldo Vandré - "Para Não Dizer que Não Falei das Flores."

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